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domingo, 18 de julho de 2010

Rio Côa (1): da nascente a Vale de Espinho


RIO SAGRADO


No ventre das Mesas
ouviu-se um gemido
de um ser que quis nascer
e correr serra abaixo
……………
Eras tu, meu Rio Côa,
que querias ser gigante
e escolheste o teu caminho rasgando montes,
dormindo em vales fundos
……………
E, hoje, sou eu que paro junto a ti,
penetro nesse templo sacrossanto do tempo que passou,
e contemplo esse andar tão lento de séculos e milénios
p’ra concluir que quase nada sou

Bernardino Henriques, “Poemas da Terra”, 2009
Eu já conhecia o "ventre das Mesas" e o correr do Côa serra abaixo. Já conhecia muitos dos seus meandros, já tinha ouvido os seus lamentos, as suas histórias perdidas, contadas nas poldras, nas velhas açudes, nas ruínas dos velhos moinhos abandonados no " tempo que passou ". Mas há muito que me fervilhava a ideia de ligar esses meandros e essas histórias, de seguir o curso do Côa ... a pé.
Em Junho e Julho de 2010, nas nossas habituais estadias em Vale de Espinho ... iniciei a minha descida pedestre do Côa.  A primeira "etapa" foi nos dias 27 a 29 de Junho.  E a etapa começou acima da nascente
Abutre de asas abertas, porque não me dás boleia?...
Lameirão dos Foios, Serra das Mesas, 27.06.2010
do Côa, no Lameirão dos Foios, a 1160 metros de altitude, onde o lençol freático muito próximo da superfície será, provavelmente, a origem primária dos dois rios irmãos, o Côa e o Águeda. A Serra das Mesas, já minha velha conhecida, é bem o ventre de onde eles nascem, ponto de partida obrigatória desta minha "peregrinação". Depois, foi seguir o curso do jovem "ser que quis nascer e correr serra abaixo". Contornando o Cabeço dos Currais e cruzada a estrada do Lameirão, chegamos aos primeiros declives acentuados e entramos na ampla curva do Prado da Barrosa. Do curso sul/norte que o caracteriza na generalidade, nos Foios o Côa corre no sentido nordeste/sudoeste. Primeiros lameiros, primeiros campos de cultivo ... e estamos nos Foios.
Atravessando o prado da Barrosa, 28.06.2010
Praia fluvial dos Foios, 28.06.2010
Logo a seguir aos Foios, o Côa recebe os seus dois primeiros afluentes propriamente ditos, na margem esquerda: os ribeiros do Colmeal e do Picoto. Cama Grande ... e os granitos vão dando lugar aos xistos ... a Serra das Mesas vai dando lugar à da Malcata. Chegamos à Fontanheira, aos pés do Cabeço do Canto da Ribeira, às Colesmas, às Braciosas. As velhas açudes, as poldras para atravessar o rio,
Pontão e Moinho dos Pecas (vista de nascente), 29.06.2010
começam a soltar-me o gemido do "tempo que passou ", das gerações que as águas viram passar, do labor dessas gerações.
Nas Braciosas, o rio entra em terras de Vale de Espinho, contornando os Cabeços da Cruz Alta e do Pisão. Surgem os primeiros moinhos ... ou o que resta deles.
Memórias que a memória não esquece...
Primeiro o Moinho do Sr. Vital, depois o Moinho dos Pecas.
Passada a ribeira dos Abedoeiros, chegamos às Veigas ... e ao Engenho. Antigo moinho, antiga fábrica de mantas, antiga "fábrica de luz", o Engenho vale só por si um compêndio de história, de memórias, de grandezas e fracassos. Quantas páginas ali se escreveram da história e da vida das gentes de Vale de Espinho e da raia...
A velha ponte de Vale de Espinho há muito que vê passar o Côa!
Pouco depois chegamos à velha Ponte, ícone de Vale de Espinho. O Moinho do Ti Xico Barbeiro é dos poucos na margem esquerda. E seguimos para o Pisão, a foz da ribeira do Vale da Maria, o Moinho do Ti Zé Lucas e o da Nogueira. Das Aleguinhas e do Freixial, que viu tantos e tantos convívios nos anos 60, 70, 80, já quase não restam vestígios, varridos pelo envelhecimento e pela desertificação. Em qualquer destes lugares, vem-me sempre à memória o pensamento de Sérgio Paulo Silva, também ele "filho adoptivo" de Vale de Espinho, da raia, da Malcata, do Côa.  Escrito  para  uma  minha  foto  do  Moinho  do  Rato ...
"E de repente damo-nos conta que envelhecemos, a ver envelhecer estas pedras que não envelhecem."

Pontão das poldras, no Moinho do Rato, 18.07.2010
Mas o Côa segue o seu curso. À margem do Cabeço do Colmeal, deixa o Moinho dos Pereiras, ou da Ponte Nova, a ponte nova que um dia viu passar a estrada que levaria a Malcata, mas que termina no Alcambar.
E precisamente junto à foz da ribeira do Alcambar, descansam os restos da última obra da arte da água e da pedra* nos limites de Vale de Espinho, o Moinho da Ervaginha.

* (Referência à obra "Rio Côa – A Arte Da Água E Da Pedra", de Nuno de Mendoça)
Moinho da Ervaginha e lameiros do Côa, Vale de Espinho (clique neste  link  para ver o álbum completo)
"Etapa" da descida pedestre do Côa entre a nascente e a barragem do Sabugal, que inclui o troço descrito neste post
13/09/2011

1 comentário:

JORGE FIGUEIREDO SANTOS disse...

Parei a descansar a vista no moinho da Ervaginha...